“Daniel Riva e a Melancolia”
Estáticos nós estávamos, eu e
ele. Eu tinha a capacidade de pensar, mas ele era mais profundo e imponente do
que eu. Eu movia os dedos, ele no ar brincava feito vento, contudo, eu o
segurava como quem segura um punhado de inseguranças...
Oh no, I see,
The spider web is tangled up with me
And I lost my head
The thought of all the stupid things I'd said
O poema se jogava sobre mim,
sobre minhas dores, sobre as minhas certezas, sobre meus juízos, sobre os
juízos que me sopesavam. O poema se derramava na navalha dos meus verbos e me sangrava a
palavra, o poema, por fim, abaulava-se nas minhas entranhas sem mesmo as
conhecer...
Oh no, what's this?
The spider web, and I'm caught in the middle
So I turn to run
And thought of all the stupid things I'd done
Estávamos ali, eu e o poema de
André Berilo, um segundo poema em minhas mãos. Mais mágico que o chegar ao
poema foi o tocá-lo. Aquelas quadras que perambulei nem lembro, apenas quando
cheguei a minha rua:
- Um homem apareceu em sua casa,
vizinho. Deixou cair isso de seu bolso, tentei chama-lo, mas ele não ouviu.
Aguardei para entrega-lo, senhor Daniel.
- Obrigado, muito obrigado.
Achei estranho, nunca falava com
vizinhos, mas a minha cabeça, ainda submersa na situação daquela mulher que eu
já esquecera o nome, e também não a denominava de santa, pois já havia perdido
a sua identidade, a minha cabeça não estava para prestar atenção se eu falava ou
não com vizinhos... Trouble...
Era a passagem para Atenas...
Dentro de dois dias estava programado para que eu embarcasse. Não sei como ele
fez, mas estava em meu nome, talvez tenha sido toda essa confusão, esses dias
não consegui me concentrar em mim mesmo. Não recordo se o enviei os dados ou
não, o fato é que aquela passagem era viva e próxima ao poema. O poema parecia capa
de um livro e a passagem introdução...
And I never meant to cause you trouble
I never meant to do you wrong
And ah, well if I ever caused you trouble
Oh, no I never meant to do you harm
Estava cansado das minhas dores,
da minha melancolia, do meu escuro, mas ao mesmo tempo estava viciado, queria
entender sobre isso... Eu amava? Isso era amor? O que é o amor? Quais são seus
objetos? Após o que ela me disse fiquei a pensar... Um nó se formou em minha
cabeça... Daniel, que Deus te guie, era apenas o que eu clamava.
Oh no, I see
The spider web, and it's me in the middle
So I twist and turn
But here am I in my little bubble
Antes de dormir aceitei, aceitei
tudo o que tinha de aceitar, o que era aceitável. Desliguei o som com o
Coldplay arquejando Trouble:
They spun a web for me
They spun a web for me
They spun a web for me
Eu sentia que estava numa teia,
além da bolha. Larguei o poema, segurei as dúvidas e demorei o sono...
Deus do Niilismo
Ó meu Deus
Deus do infinito, do nada
Ó meu Deus do desconhecido
Do anoitecer e da minha alvorada
Deus destituído e falido, meu Deus, meu abrigo
Minha esmola, minha muleta
Deus que não há dentro, não há fora
Meu Deus do nada, sem silhueta, sem forma
Ó meu Deus que em ti não acredito
Sê apenas uma companhia, que preciso
Não fala, quero teu silêncio, teu nada
Ó Deus do desconhecido, desce
E dorme comigo...
Deus não desceu, mas o poema com
Daniel dormiu.
(Por Marcos P. S. Caetano)
Fortaleza, 00h34 de 04 de Outubro de 2011
Série Daniel Riva:
Pintura: Albrecht Dürer, Melancolia I, de 1514.
Palavra da Vez:
melancolia
s. f.
1. Tristeza profunda e duradoura.
2. Hipocondria.
Referência Musical: Coldplay - Trouble
Muito bom Marcos.
ResponderExcluirachei de uma intensidade fenomenal.