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sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

O Direito Abstrato em George W. F. Hegel, segundo Thadeu Weber.


Johann Georg Schlesinger - Retrato de Hegel
Óleo sobre tela


O Direito Abstrato em George W. F. Hegel, segundo Thadeu Weber.



O Direito Abstrato é um conceito abordado na obra “Os Princípios da Filosofia do Direito” (1821) de Georg W. F. Hegel (1770-1831), que será analisado por meio desta na ótica de Thadeu Weber (UFRGS), em sua tese de doutorado: “Hegel: Liberdade, Estado e História”. Passaremos por alguns momentos para a configuração total da idéia, entre eles: posse, propriedade, contrato e injustiça.
Começaremos pela identificação do indivíduo, do sujeito, sendo formado pelo processo de coisificação. Onde o Indivíduo é o sujeito de vontade, já a coisa não; portanto, a coisificação de algo no mundo demonstra a aparição do sujeito, que, ao mesmo tempo, atesta a coisa, “coisificando-a”. Poderíamos perceber isso em três instâncias, são elas o anúncio, a consciência e a efetivação, segundo Ramiro Flórez, como indica T. Weber. Essas três instâncias formularão a base desse direito abstrato; sendo o anúncio o dizer da liberdade, a consciência o indivíduo perceber-se livre e a efetivação a exteriorização da liberdade do indivíduo. Então, podemos nos perguntar: como se passa essa exteriorização, isto é, essa efetivação da liberdade em Hegel? Na Posse. Assim, entraremos no primeiro momento do Direito Abstrato.
A posse de algo, isto é, da coisa pelo sujeito de vontade livre é a externalização dele no mundo, o primeiro contato de fato da liberdade. Não só a posse, a apropriação, mas o uso da coisa pelo indivíduo. Contudo, a posse ainda não se traduz como propriedade, para se passar desse primeiro momento para o segundo, a propriedade, precisamos do reconhecimento. Isto é, é o reconhecimento da posse e do uso de um indivíduo por outro que faz com que a simples posse se torne propriedade. E assim, o reconhecimento faz com que a vontade livre de um indivíduo seja reconhecida por outro, efetivando, de fato, a liberdade no mundo.
Podemos observar, também, outra característica da propriedade, que a difere da posse, enquanto a posse é provisória, a propriedade é permanente. Pois enquanto posse ela pode ser tomada pelo outro, contudo, enquanto propriedade ela é reconhecida pelo outro, ampliando o seu estatuto. Porém, a “a propriedade plena inclui uso e troca” (T. Weber), e a troca, isto é, segundo Hegel, a capacidade de alienação da coisa, é um novo reforço das liberdades. Entendendo essa alienação, essa troca, como a impossibilidade de ser proprietário de algo que é posse do outro. Logo, observamos, como Thadeu, que “a propriedade comum colocaria em risco as liberdades individuais” e que “a propriedade é necessariamente desigual”.
Um último ponto sobre o uso e a troca é a contradição entre eles, isto é, “quando uso não posso trocar, quando troco não posso usar”, tornando-se o movimento dialético, como em toda a obra hegeliana.
No momento em que estamos na análise, percebemos uma nova exigência ao Direito Abstrato, que é o próximo momento, aquilo que é exigido quando se pauta a troca, aquilo que possibilita, que é o contrato. Uma exigência para a relação entre vontades.
O Contrato tem por característica o reconhecimento entre as vontades, não importando a qualidade da coisa, mas a relação entre as duas vontades livres. O importante é o consentimento, o reconhecimento e a aceitação das duas vontades livres. “As regras do jogo dizem respeito às relações entre pessoas, independentemente da qualidade da coisa” (T. Weber). Sendo assim, esse reconhecimento entre as liberdades abre caminho para a dimensão social dos sujeitos, onde o Estado se mostrará como regulador último do contrato. Aparece-nos outro ponto da efetivação do indivíduo no mundo, o Estado. “(...) o indivíduo só se realiza no Estado (...)”.
É evidente que esse processo de concretização da liberdade é acompanhado pelo processo de abstração da base material, isto é, a qualidade da coisa, da coisa de fato. A indenização em dinheiro, como exemplifica T. Weber, é a prova da abstração da coisa em favor da vontade. “O valor da coisa não entra em jogo porque é determinação econômica e não jurídica”.
Formalizado no Direito Abstrato o indivíduo livre na posse, na propriedade e no contrato, abre-se a porta para um terceiro momento que é uma problemática desse direito abstrato, é ela a Injustiça. Esse será o próximo momento.
“Pelo direito abstrato, não é possível impedir a possibilidade de alguém impor a sua vontade sobre o outro, reprimindo-a.”, já que o contrato é subordinado ao reconhecimento entre vontades livres e abstraído de bases materiais, “Daí a injustiça.”. Somente as vontades livres podem fazer justiça ou injustiça, “tal como o direito, a injustiça decorre de vontades livres. As coisas não são justas ou injustas, mas só de vontades livres podem surgir atos injustos.”. Pois, as vontades, mesmo em contrato, ainda reservam sua liberdade, ao ponto de, por exemplo, quebrar o contrato. Além disso, a vontade particular ainda pode, inúmeras vezes, ser contrária a vontade geral (direito abstrato), causando danos e injustiça. Destarte, observaremos os três modos de injustiça segundo o direito abstrato: a Injustiça de boa fé, a Fraude, a Violência e Delito.
Na injustiça de boa fé a vontade alheia é lesada de modo involuntário. Muitas vezes por não saber das conseqüências. Geralmente pela confusão onde “a pessoa toma como direito o que ela quer”.
Na fraude temos uma injustiça de grau mais intenso que na de boa fé. É esta com intenção de lesar, com intuito de fechar o contrato. “O direito é para o fraudulento uma aparência. Uma forma indireta de lesar a vontade de outrem.”. T. Weber nos exemplifica com o vendedor que esconde certa informação, a fim de fechar o contrato, lesando a vontade do comprador, pois não terá toda a informação da coisa comprada. Atentemos para o detalhe que a fraude se configura, portanto, em lesar o direito universal – haja vista no exemplo que o vendedor que deveria passar todas as informações da coisa para a avaliação do comprador – e não a vontade particular.
Por fim, temos a Violência e o Delito. É a forma mais intensa, é o querer ser injusto. É onde não há reconhecimento do direito do outro (aqui a propriedade voltaria a ser posse), pois há intenção de ferir a vontade alheia – liberdade de um sujeito. Disso vem à tona o castigo. “A penalidade representa uma tentativa de anular, objetivamente, um mal também objetivamente causado, ou, senão, pelo menos de restabelecer a ordem jurídica constituída.”. O castigo não como vingança, mas como justiça, de forma a trazer de volta a racionalidade do delituoso. Contudo, a pena, por quem sofre, sempre é vista como vingança. A lei, por sua vez, pode, por si mesma, ser injusta – o abuso do poder pode provocar novas injustiças (T. Weber).
Essas contingências (vontades particulares), para Hegel, percebemos, devem sempre ser superadas em prol de uma universalização. É pertinente, outrossim, observar que o direito abstrato está superado e guardado na moralidade, e por ser momento insuficiente será (terá de ser) seguido por outro. Sendo assim, a vontade livre particular teria de encontrar em si o universal: “Isso significa o reconhecimento subjetivo da igualdade e da liberdade como princípios universais”.

Escrito por: Marcos Paulo Souza Caetano. (16 de Janeiro de 2013)
Instituição: Universidade Federal do Ceará - UFCe.
Orientado por: Prof. Dr. Eduardo F. Chagas.


Links: Os Princípios da Filosofia do Direito - G. W. F. Hegel (em Inglês)


Palavra da Vez:
direito 
(latim directus, -a, -um, em linha reta
adj.
1. Que corresponde à distância mais curta entre dois pontos. = RETO
2. Sem curvas nem irregularidades. ≠ SINUOSO, TORTO
3. Que fica à direita.
4. Que está de pé. = APRUMADO
5. [Figurado]  Justo, reto; acertado.
6. Que está bem, que está como é devido.
adv.
7. Em linha reta.
8. De forma direta; sem desvios.
9. De maneira considerada correta.
s. m.
10. O que pode ser exigido em conformidade com as leis ou a justiça.
11. Faculdade, prerrogativa, poder legítimo.
12. Complexo de leis sociais.
13. Lado principal. ≠ AVESSO

direitos
s. m. pl.
14. Imposto, taxa (ex.: pagar direitos).
direito canônicoconjunto de leis que regula a disciplina eclesiástica.
direito autoralo mesmo que direitos autorais.
direito comumconjunto de princípios e normas que se aplica à generalidade dos casos em sociedade, em coletividade.
direito das genteso mesmo que direito internacional público.
direito de autoro mesmo que direitos de autor.
direito de propriedadedireito que o homem tem de conservar o que lhe pertence e de apropriar-se daquilo que outrem lhe cede legalmente ou que adquire sem contestação.
direito internacional privadoconjunto de princípios e normas que regula os conflitos emergentes de relações jurídicas privadas internacionais.
direito internacional públicoconjunto de princípios e normas que regula as relações entre diferentes estados soberanos.
direito naturalconjunto de princípios e normas considerados primordiais e baseados na natureza humana, considerados anteriores à teoria jurídica. = JUSNATURALISMO
direitos autoraispara um autor ou seu editor, direito exclusivo de explorar durante muitos anos uma obra literária, artística ou científica.
direitos de autorpara um autor ou seu editor, direito exclusivo de explorar durante muitos anos uma obra literária, artística ou científica.
montante que um autor recebe pela comercialização da sua obra.
direitos de cidadeo mesmo que foros de cidade.
direitos políticosaqueles com que o cidadão intervém nos negócios públicos.

Um comentário:

  1. Para um entendimento rápido do que é "direito abstrato", seu texto foi de grande valia. Obrigado.

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